sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Anta Nova no Pedaço!

Em dezembro do ano passado (adeus ano velho), no Journal of Mammalogy (periódico científico especializado na biologia dos mamíferos de todo o mundo), um artigo anunciando a descoberta de uma nova espécie de anta brasileira. Batizada com o nome científico de Tapirus kabonami, a nova espécie de anta apresenta patas mais curtas e é menor que a já conhecida anta brasileira (Tapirus terrestris).

Por causa da coloração mais escura é chamada, entre a comunidade local, de Anta Pretinha. O achado é de grande importância para a Ciência já que, nos últimos cem anos, apenas uma espécie de mamífero de grande porte foi descoberta.




Minha satisfação em escrever sobre esta descoberta é imensa já que o coordenador da pesquisa, Mario Alberto Cozzuol, foi meu professor de anatomia comparada durante a graduação em Ciências Biológicas na Universidade Federal de Rondônia (mais conhecida por UNIR). Foi durante a sua passagem pela UNIR que a pesquisa que deu origem a descoberta da anta pretinha começou. Um das alunas de iniciação científica e estudante de Biologia, orientada pelo professor Mario A. Cozzuol, ao estudar uma coleção de crânios de Tapirus percebeu que um deles era menor do que os outros exemplares.


No primeiro momento parecia se tratar de um indivíduo juvenil, mas o curioso era que todos os dentes molares já haviam nascido e estavam com as coroas bastante desgastadas, ou seja, era um animal velho, mas de tamanho pequeno. Os crânios foram estudados de forma mais detalhada comparando-se os dados de morfometria. Os relatos de garimpeiros, caçadores, extrativistas e indígenas, da existência de dois tipos de anta, a “Rosilha” e a “Pretinha”, determinaram o surgimento da hipótese da existência uma espécie de anta ainda não descrita pela ciência.


Com a informação da possível existência de uma nova espécie de anta disseminada, havia uma corrente de biólogos que buscavam informações sobre a Anta Pretinha. Com isso foram registrados relatos em diferentes partes da Amazônia, Pará, Amapá, Amazonas e Rondônia. O desafio era provar para o mundo, que os moradores locais estavam certos, tendo como base apenas um crânio. Foram necessárias análises genéticas e morfométricas além de muita persistência para finalmente, após uma década de estudo, o mundo pudesse conhecer a mais “nova” anta do pedaço.


A confirmação da descoberta de uma nova espécie de anta só foi possível depois da análise de novos materiais conseguidos em expedições, financiadas pela Fundação Boticário, que corroboraram a hipótese de uma nova espécie de anta. "Amostras de animais da Colômbia e da Guiana Francesa mostram que esta espécie possui ampla ocorrência na Amazônia. Indicam ainda uma preferência por áreas de enclaves de cerrado, com vegetações de savana ou arbustiva. Entretanto isso são análises preliminares que precisam ser estudadas mais a fundo para determinar os aspectos ecológicos que determinam sua ocorrência e abundância" relata, Samuel Nienow – um dos coautores da pesquisa.


Ainda segundo Samuel, outra questão a ser estudada é o status de conservação, que é,no mínimo, vulnerável a extinção, uma vez que todos os Tapirus estão nesta condição (de acordo com a classificação da CITES), mas não sabemos se a população de T. kabomani está mais ou menos ameaçada. A hipótese é que esteja mais, devido sua ocorrência mais restrita e o avanço da ocupação antrópica nos locais de ocorrência comprovada desta nova espécie, que coincide com a implantação de grandes obras, como a instalação de duas usinas hidrelétricas no rio Madeira, uma ponte sobre o rio Madeira, na BR 319 que liga Porto Velho a Manaus, e a pavimentação completa da BR 319".


Aos futuros cientistas, Samuel recomenda: “prestem atenção no que a população local relata, nas suas histórias de caça e nos seus “causos”, pois é uma ótima oportunidade para você exercitar seus conhecimentos científicos, seja explicando em uma linguagem acessível o que a ciência já provou ser um mito, seja buscando mais informações que podem levar ao registro da ocorrência de uma espécie da qual não se tinha informação que ali ocorria, ou até mesmo para a descrição de uma nova espécie, como nosso caso”.


Despeço-me agradecendo ao biólogo Samuel Nienow - pela atenção, imagem e informações concedidas para a publicação deste post e ao professor Mario Cozzuol e demais pesquisadores, envolvidos no projeto, por esta grande contribuição para a Ciência mundial. Que a dedicação e persistência de vocês sirva de exemplo e inspiração para a nova geração de pesquisadores que esta sendo formada em nosso país. Muito obrigada!


Journal of Mammalogy 94(6):1331-1345. 2013 doi: http://dx.doi.org/10.1644/12-MAMM-A-169.1 Acesse o artigo completo!

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